"É inútil trancar as portas se o inimigo já se encontra do lado de dentro."
Foi com essa frase que Casas de Vampiro me arrebatou de vez.
Eu caminhava vagarosamente pela Leitura Megastore do BH Shopping, em um de meus programas favoritos - garimpagem literária -, quando me deparei com o livro em destaque na prateleira destinada à literatura mineira, ao lado de Rubem Fonseca. Logo, decidi tirar uma foto para enviar ao autor, o querido Flávio Medeiros. O que eu não esperava, no entanto, é que a sinopse do livro me obrigasse a lê-lo imediatamente.
Bom, é importante esclarecer que eu já conhecia o talento literário do Flávio, pois tive o prazer de ler o seu primeiro romance - Quintessência. Mas estava adiando a leitura do Casas de Vampiro, pois a minha lista de livros para ler estava (e ainda está) enorme!
Contudo, assim que li a sinopse da obra, em que está inserta a frase citada, percebi que não dava mais para adiar. E assim que dei início à leitura, constatei o óbvio: não dava mais para parar.
Em linhas gerais, a história dos mistérios que envolvem o protagonista Gil começa na infância, quando ele se depara, pela primeira vez, com uma "casa de vampiro". E ninguém passa por um lugar como esse e escapa impunemente. Obviamente, a vida de Gil é marcada por esse incidente, e ele descobre que a sua sobrevivência e a de sua família dependem da investigação de todos os segredos obscuros que ele sempre evitou.
Será que Gil é esquizofrênico? Ou será que encontrará as explicações para todos os eventos sobrenaturais que o perseguem? De quem são as "vozes" que ele escuta? Será que pode confiar em alguém? E em si mesmo?
Numa narrativa eletrizante, que mistura ficção científica e suspense investigativo, Flávio constrói uma trama instigante e envolvente que prende o leitor do início ao fim. Mistérios, segredos, intrigas, traições e grandes revelações são os ingredientes que tornam o enredo labiríntico e surpreendente.
Sempre tive certa fascinação por livros e filmes de vampiros, embora não seja fã inveterada de literatura fantástica. Contudo, Flávio conseguiu desconstruir tudo o que eu conhecia até então, apresentando uma nova perspectiva, que joga por terra a imagem do vampiro tradicional.
Eu pergunto: Existem vampiros? Quem são eles?
Flávio nos dá essas respostas, de uma forma nada óbvia. E, de repente, tudo o que você já leu ou ouviu sobre essa figura mitológica cai por terra, e você faz uma deliciosa releitura do "vampirismo" tradicional. E não é que a surpresa é boa?
"Talvez a imagem mitológica do vampiro seja mesmo a mais adequada que a humanidade tenha sido capaz de formular" (pag. 260)
Flávio descortina ainda questões muito interessantes relacionadas à imagem mitológica do vampiro, desde a Antiguidade. Faz menção a fatos históricos ligados à construção da imagem vampírica tradicional, citando, por exemplo, os inúmeros casos de porfíria na Idade Média, que chegaram a ser confundidos com vampirismo por falta de conhecimentos médicos na época.
Com certeza, a escrita desse livro exigiu estudos e pesquisas por parte do autor, o que lhe confere mais mérito. Gosto das leituras em que aprendo coisas novas, em que termino com aquela sensação de acréscimo. Senti isso ao terminar o Casas de Vampiro.
E senti também algo semelhante ao que experimentei quando assisti, pela primeira vez, ao filme A Vila, de M. Night Shyalaman. Nada é o que parece. E a surpresa é muito boa! No caso do filme, acho que atraiu o público errado, razão pela qual não teve a repercussão que merecia. No caso do livro, acredito que o desfecho está sendo diferente. Em outras palavras: não é um livro para o Homer Simpson. Não, ele não vai entender. Ele não vai perceber que Flávio toca em questões viscerais, de forma crua, como, por exemplo, a vulnerabilidade do ser humano, que ele aborda com maestria.
"O ser humano não capacitado consome todo o seu tempo de vida sendo jogado de um lado para outro, como um navio sem leme ou timoneiro, ao sabor do capricho dessas entidades mentais" (pag. 266)
Sempre acreditei na livre interpretação das obras. Como diria Carpinejar, a escrita nasce no momento em que é lida. Portanto, somos livres para encarar a obra como uma grande e bela metáfora. E, nesse caso, qualquer semelhança com a "vida real" não é mera coincidência. Isso me remete a outro filme, Matrix, que, de certa forma, utiliza os mesmos recursos que o autor para expôr tema semelhante.
Não posso falar mais, pois corro o risco de ser indiscreta e produzir um spoiler. Cada um deve ter o prazer de degustar, por conta própria, esse livro. Mas fica um conselho: não deixe de dar especial atenção ao capítulo final - Entrevista com o Vampiro -, pois é sensacional!
Para quem gosta de um bom suspense, o livro tem ótimas cenas, que me deixaram arrepiada. E, para quem gosta de ação, Flávio dá de presente cenas que fazem valer toda a leitura.
Enfim, Casas de Vampiro é uma obra imperdível, uma bela homenagem ao mito (não sei se antigo ou eterno; seria melhor que Dante Alighieri respondesse) vampírico.
Literatura nacional da melhor qualidade. Super recomendado!!!
Sinopse:
Muitos mistérios acompanham a humanidade desde os primórdios, sem jamais vir à luz uma resposta satisfatória sobre eles. Lendas nada mais são que tentativas do homem de explicar de forma figurada os fenômenos que extrapolam a razão e ameaçam arremessá-lo nos rumos tortuosos da insanidade. Entrar em uma “casa de vampiro” é abrir a porta para enigmas milenares. Mas o preço pago pode ser alto demais. E é isso o que Virgílio descobre depois que um incidente em sua infância desencadeia uma série de acontecimentos que irão assombrá-lo até a morte. É inútil trancar portas se o inimigo já se encontra do lado de dentro. O mundo é ameaçador quando descobrimos não estarmos mais no topo da cadeia alimentar. O desconhecido é mais piedoso do que as verdades antes ocultas. As “casas de vampiro” estão sempre próximas. Mas você não sabia. Agora sabe. E, ainda assim, pode ser tarde demais. Descubra.
Flávio Medeiros nasceu em Belo Horizonte, onde vive com a esposa e uma coleção absurdamente grande de filmes, livros e histórias em quadrinhos. Formado em Medicina pela UFMG, especializou-se em Oftalmologia. Escreve desde a infância, tendo produzido uma grande quantidade de contos, crônicas e cartoons, publicados em jornais universitários e suplementos culturais. Também escreveu e dirigiu peças teatrais. Publicou seu primeiro romance em 2004: Quintessência, uma história policial com ambientação de ficção científica. Foi vencedor do Prêmio Bráulio Tavares em 2008, na categoria minicontos. Possui contos publicados em vários livros.
Oi, Cynthia!
ResponderExcluirO melhor nem é ler uma resenha tão elogiosa. É perceber que o leitor compreendeu perfeitamente o "espírito da coisa"! Parabéns, e muito obrigado. Peixocas!
O livro foi realmente intrigante e o final surpreendente. Mais do que isso, nos faz pensar sobre as forças do universo.
ResponderExcluirFlávio, estamos apenas esperando a publicação do próximo livro. Abraço,
Jean Breves.
Fiquei curiosa pelo livro.
ResponderExcluirJá está mais do que na hora de mostrar como o vampiro era visto e como ele ficou depois de migrar para as páginas dos romances.
Já vi cada comentário absurdo de gente que se diz "expert" em vampiros.
Não tinha ouvido falar deste livro ainda, aliás é a primeira resenha que leio. Gostei e já anotei.
ResponderExcluirBjs, Rose.